quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Os custos indiretos da propriedade

A busca pela segurança em termos de preservação do patrimônio amealhado ao longo da vida, a expectativa de valorização, somadas a resquícios de uma memória inflacionária, nos leva, muitas vezes, a conservar a maior parte do nosso patrimônio sobre a forma de propriedades, principalmente imóveis.

Durante o período de inflação crônica vivido pelo Brasil, entre as décadas de 1970 e 1990, a moeda perdeu uma de suas principais funções, qual seja, a de reserva de valor. Os brasileiros nascidos até a metade da década de 1980 foram educados a se livrar rapidamente do dinheiro, trocando-o por mercadorias ou bens, sob risco de perda de parte do patrimônio corroído pela inflação.

Essa conjuntura inflacionária levava as pessoas e as empresas a investir o máximo de suas reservas em mercadorias e bens e a abrir mão de uma maior liquidez. No caso das pessoas físicas, imóveis principalmente. Ainda hoje, após 17 anos de estabilização da economia, ainda se conserva um relativo temor em guardar parte do patrimônio em dinheiro, aplicado numa instituição financeira, por exemplo. Conservamos, ainda, uma desconfiança que, com o passar do tempo, possamos perder parte de nossa riqueza pois o valor investido, acrescido dos juros e da correção monetária, não compram mais os bens que poderíamos ter comprado na data em que tomamos a decisão de fazer a aplicação.

Somem-se a esses fatores, a condição financeira de significativa parte das famílias brasileiras, principalmente aquelas que, historicamente, estiveram excluídas do acesso à propriedade. Tanto na condição de habitantes do campo quanto do meio urbano.

Com o crescimento econômico experimentado pelo Brasil, nas últimas duas décadas, acrescido das facilidades de crédito, as famílias estão optando pela aquisição de propriedades, principalmente de habitações para uso próprio.

Nesse caso, é sempre recomendada a opção pela propriedade do imóvel. Esta é mais do que uma pré-condição para uma melhor qualidade de vida. É, também, uma condição de cidadania.

Essa questão ganha uma conotação diferenciada quando passa a ser opção de investimento e de reserva de valor. Nesses casos, tem-se que considerar um fator por muitos negligenciado, qual seja, o custo indireto da manutenção de uma propriedade. Não quero dizer aqui que as pessoas não devam investir em imóveis, mas, sim, discutir a relevância desses custos na manutenção do imóvel, ao longo do tempo e apontar possíveis alternativas para o investimento das reservas pessoais.

Quando começamos nossa vida profissional, particularmente no caso das pessoas que ambicionam um crescimento patrimonial, o desejo da propriedade é extremamente aguçado. Olhamos os bens materiais e só enxergamos o lado bom. Somos quase que incapazes de enxergar as dificuldades, tanto na obtenção quanto na manutenção do bem.
É interessante que, em certo período da vida, paramos para refletir e constatamos duas questões relevantes: primeiro, temos o sentimento de que passamos à condição de escravos dos bens que amealhamos ao longo da vida; segundo, além de dispensar uma parte significativa de nosso tempo para cuidar de sua manutenção, conservação e preservação, temos ainda que trabalhar, e muito, para fazer face aos desembolsos financeiros necessários para manter sua propriedade.

Isso porque, na maioria das vezes, os bens que adquirimos nos dão mais despesas do que receitas. Principalmente se considerarmos que hoje, no Brasil, os aluguéis de imóveis, na maioria das cidades, estão extremamente baixos. E tão mais baixo, quanto maior o valor do imóvel, com exceção de alguns imóveis urbanos muito bem localizados, o que não é o caso da maioria.

As despesas são representadas pela reposição do que é corroído pela ação do tempo, como pinturas, telhados, calhas, portas e janelas, vidros, instalações elétricas e hidráulicas, entre outros; pela ação de vândalos que destroem vidros, pinturas de muros e fachadas; pela ação de ladrões que, além de roubar o que podem, ainda destroem o que lhe cause algum transtorno durante a ação; pelo pagamento de taxas, contribuições de melhoria e impostos; pela contratação de seguros contra incêndios, vendavais e outras ações da natureza; ou, na falta desses, pela reposição do que a natureza destrói, no caso de uma catástrofe que, ultimamente, tem se tornado mais comum. Sem contar o desgaste na relação com inquilinos e com todos os profissionais envolvidos nesses processos.

Como contrapartida financeira imediata, somente o recebimento do aluguel que, muitas vezes, não chega a atingir 0,50% do valor do imóvel, considerando que, em primeiro lugar, somente a inflação atual atinge índice próximo desse percentual e que, em segundo lugar, em muitas cidades a valorização do imóvel é bem pequena.

Somado a esses fatores, devemos lembrar que, quando da venda do imóvel, são devidos comissão ao intermediador do negócio, algo em torno de 5% do valor total do imóvel, imposto de renda à razão de 15% sobre o que o Fisco entende por ganho de capital e, acrescido a isso tudo, a demora na comercialização que, no final do processo, nos dá a sensação de que só o que vamos comprar tem valor. Quando estamos vendendo, temos a sensação de que o que possuímos não tem quase valor.

Outra variável que precisa ser colocada na equação é o fato de que, à medida que vamos envelhecendo, temos mais dificuldades para manter o padrão da renda auferida com o trabalho. É exatamente para esse momento que guardamos uma parte da renda que auferimos ao longo de nossa vida produtiva. Em contraposição a essa realidade que são peculiares aos investimentos em bens tangíveis, particularmente representados por imóveis e, nesse caso, os imóveis urbanos são mais próximos do que aqui descrevemos, pode-se considerar as alternativas que temos hoje para a guarda de nosso patrimônio pessoal, amealhado ao longo da vida ou que se está obtendo atualmente.

Em primeiro lugar, a economia brasileira cresceu e se desenvolveu muito, nessas últimas duas décadas. Concomitante a esse crescimento, o mercado de capitais cresceu e se desenvolveu no Brasil. O investimento em ações, com visão de longo prazo, passou a ser uma interessante opção para a guarda de patrimônio. Sem contar que possui uma liquidez praticamente imediata. Lembrando sempre que o ideal é sempre efetuar a venda em momento de alta e não de baixa, como vivemos nesses dias atuais.

Por outro lado, o sistema bancário brasileiro é, hoje, um dos mais sólidos do mundo. Pode-se investir em aplicações financeiras, sempre com orientação de um profissional especializado, no caso dessa opção ser a escolhida, sem a desconfiança de que o banco poderá quebrar.

Em terceiro lugar, o Governo Federal se tornou um importante captador de recursos, por meio das operações de Tesouro Direto, que são interessantes opções de investimento, principalmente para o médio e longo prazos.


Esse artigo tem como objetivo elencar as principais dificuldades que encontramos na gestão de nosso patrimônio, quando esse está representado por imóveis e chamar a atenção para a importância das opções que temos hoje de investimentos cuja remuneração não é nada desprezível, além de requerer o mínimo possível de tempo e recurso financeiro na sua gestão, bem como oferecer um grau de liquidez praticamente diário, coisa que os imóveis estão distantes de oferecer.

É interessante também acrescentar que não se deve investir em um único tipo de bem. O dito popular "não coloque todos os ovos num único cesto" é bastante oportuno para o caso. Dados todos os custos indiretos que recaem sobre os imóveis e considerando as opções de investimento que temos hoje, em ações, títulos do governo e produtos bancários, é possível montar um portfólio de investimentos que nos dê rentabilidade e segurança, sem nos dar muito trabalho e exigência de desembolsos financeiros e dispêndio de tempo.


Autor: Alfredo Fonceca Peris
Economista e sócio-diretor da Peris Consultoria Empresarial